domingo, 9 de janeiro de 2011

NOSSA RIQUEZA MAIOR


Os gametas que me deram origem marcaram encontro num ambiente rural e bucólico: uma roça de cacau.

Quando faltavam poucos dias para completar os nove meses de gestação, pela primeira vez, segui em direção ao mar, do qual nunca mais me afastei. 

Por segurança, meus pais decidiram levar-me à cidade para que viesse à luz na presença de um profissional da medicina.

Ainda no útero materno, guardei vagas lembranças daquela viagem... Alguns podem até afirmar que eu não possuía ainda as faculdades de enxergar... como então descrever tal viagem!?

Ora, esses parecem esquecer-se da terceira visão, a visão da alma, do espírito...

O transporte? Depois de algumas léguas no lombo de burros e mulas, às margens do Rio Pardo, embarcamos numa enorme canoa carregada com mais de cem (100) sacos de cacau.

O que me inspira e me move nessa insípida prosa é a indignação.  Indignação pelas nefastas ações daqueles que intentam tomar posse do MAR. Uns para a instalação de equipamentos comerciais, a beira-mar; outros para a culminância de finalidades espúrias, embutidas no chamado "ambientalismo".

O texto abaixo, utilizo para externar parte dessa minha indignação:

        Minha vida é o meu Mar...
Presente, futuro, retorno ao passado,
Lembranças d’um tempo que se foi
Fatos relevantes, sutis e banais
Marcas d’uma época que não volta mais.

A caminho do meu Mar...
Numa bela viagem: Barreiras-Canavieiras
O forte odor das secas amêndoas d’ouro
Exala da tosca sacaria em fios de linhagem
Misturando-se ao suor do intrépido canoeiro.

Odores exalam da empírica arte de cozinhar...
O cheiro da carne de sertão empesta o ar
Em frenética dança fervente, na tolda, o fogão
Inequívocos dotes culinários dos homens do rio.
Mescla perfeita de barro, carne, água e feijão.

Em clausura uterina, singro as águas do Pardo...
Sol de novembro anuncia Primavera em ocaso
Rio que me leva aconchegado ao ventre materno
No calmo espelho d’água, principio na arte de navegar
Singrando a jusante pra ver o meu Mar.

Enfim, respiro o perfume típico do meu Mar...
Narinas e pulmões se enchem, enfim, de ar.
Atordoado, ainda, com espanto, abrolhos
Primeira vez, enxergo com os olhos do olhar.
Embora defronte, ainda não vejo o meu Mar.

Crescendo, sou as ondas do meu Mar...
Em suas entranhas, sem cerimônia,
Vou mergulhando fundo, profundo
Em seu tempero e maciez, me escondo
Aos poucos, o domino, aprendendo a nadar.

Inspira-me ver, pensar no meu Mar...
Esse mesmo extraordinário mar...
Que um dia foi meu, um dia foi seu
Mas alguns poucos insensatos,
Como se donos, querem tomar.

Transpiro o suor do meu Mar...
Em gotas serenas, suaves
Multicoloridas
Com gosto e tempero de sal
Sem saber até quando vou transpirar.

Conspiram contra o meu Mar...
Alguns poucos, loucos, egoístas
Mercadores, capitalistas
Em impensados e desvairados atos
Resolvem cercar as praias do meu Mar.

Outrora livres ondas do meu Mar...
Hoje, impedem-me de surfar.
Surgem, repentinamente, os “ativistas” de plantão
Pretensos defensores do meio ambiente
Dizendo-se diferentes, mas, iguais na intenção...

Intentam, da mesma forma, retirar-me o meu Mar...
Esse meu mar sereno, que também é seu;
Que numa onda me deixou partir
Na mesma onda me trouxe
E de novo quer me levar.

Violentaram o meu Mar...
Filhos da própria Terra
Cegos de soberba,
Ensopados de ilusão
Esqueceram o verbo amar.

Arrancaram-me do meu Mar...
Se um dia deixei o meu mar
Na busca de outro mar
O coração do mar me trouxe
O mesmo mar quer me levar.

Falece o dia, espraia-se tenebrosa noite
Trevas e emaranhados me cercam
Amarfanhado e martirizado prossigo,
Nas mãos, candeias tênues de luz
Mas, coerente... lúcido, livre... resisto!

Como toda onda, um dia essa loucura passa...
Impõem-se perseverar se insurgindo contra.
Quanto ao eterno Sol de fogo que queima... (não esqueçamos...)
Somos todos superiores ao tempo.
Estou indo ali... é por pouco tempo...  não vou demorar!

Uma nova onda agora me leva,
Ainda que forte terral me intime a ficar.
Mal cabendo no peito, o coração palpita
Na esperança da breve hora de voltar.
Encerro deixando meu singelo ponto de vista:

O MAR É DE TODOS... NEM RESERVAS EXTRATIVISTAS... NEM PRAIAS CERCADAS POR CAPITALISTAS!

Autor: Souza Neto (2006)

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