segunda-feira, 16 de maio de 2011

PAGANDO MICO NO RIO GRANDE

GptFN de Rio Grande
No ano de 96 fui designado para integrar uma Equipe Móvel de Instrução (MOVIN) que estava indo para o Rio Grande do Sul, mais exatamento para Rio Grande, onde nossa Marinha se faz presente com o 5º Distrito Naval e suas Unidades subordinadas, entre as quais o Grupamento de Fuzileiros Navais de Rio Grande.  Nossa Missão era realizar a MOVIN para os Fuzileiros Navais do Grupamento.

No Rio, embarcamos bem cedo num avião da Varig e, no horário previsto, estávamos em Porto Alegre.  Como esse primeiro dia foi planejado apenas para o deslocamento, fizemos tudo para chegar a Porto Alegre com tempo suficiente para um passeio na cidade, dando reinício à viagem  para Rio Grande depois do almoço. Esse segundo trecho foi via terrestre, por ônibus.  

No meio da viagem, o motorista faz a primeira parada num restaurante de beira de estrada. Nossa equipe desce para as necessidades mais urgentes e fazer um lanche.  O primeiro "mico" quem "pagou" fui eu. Dirijo-me à garçonete e peço um guaraná.  Ela me olha e pergunta:  "Gelado ou natural?"  Meio espantado, em respondo:  "Como, gelado ou natural!? Alguém bebe refrigerante quente?"  A moça, educadamente me responde:  "Desculpe senhor, mas estamos na temperatura ambiente de 5 graus, e nessas condições aqui preferimos consumir as bebidas sem refrigeração!"  Falou, apontando para o medidor de temperaturas que estava afixado em uma das paredes.  Era o mês junho... Disse gentilmente à bela gaúcha: "Pode ser natural, mesmo!"

Seguimos viagem...  Chegamos ao Grupamento em Rio Grande na boca da noite.  Fomos recebidos e alojados em alguns camarotes.  No camarote em que eu estava éramos dois.  O outro oficial era um colega de turma no curso de formação. Aí veio o segundo "mico" do dia.  O camarote só tinha um banheiro e o oficial que o dividia comigo (não digo o nome nem com ameaça de morte) disse gentilmente: "Souza Neto, pode tomar seu banho aqui que eu vou me safar no banheirão coletivo que vi ali quando passamos".  Dito e feito.  Entrei no boxe e o meu amigo escafedeu-se na direção do tal "banheirão" que tinha visto.  Mal havia acabado de enxugar-me, ouço batidas na porta do camarote e um chamamento:  "Souza?".  Abro a porta e um outro oficial me diz:  "Vem aqui rápido, o Ju... (ops quase escrevi o nome do cara!) está passando mal!"  "Está com hipotermia!".  Vesti alguma coisa  e fomos lá...  Encontramos o meu companheiro de camarote sobre um beliche, debaixo de 5 cobertores e com todos os aquecedores que foram encontrados por perto à sua volta.  "O que foi bicho?" Perguntei.  Com voz trêmula e entrecortada, meu amigo e Comandante respondeu:  "Brrrr... Decidiiii tomarrrr bannnnho frioooo!"  Dei uma risada e disse:  "Mas, agora tá tudo bem, né campanha!?" Ele assentiu, fazendo sinal com o polegar.

Parrillada Argentina
No dia seguinte, trabalho em tempo integral.  No final do expediente, recebemos um convite de um Capitão que servia no Grupamento para irmos a Pelotas à noite.  Justificou o convite dizendo que em Rio Grande não tinha nada pra se curtir à noite, a não ser frio e vento.  Que Pelotas era uma boa opção.  No horário combinado, dois carros estavam à nossa disposição e rumamos pra Pelotas.  Os veículos pararam o mais próximo possível da adega escolhida pelo nosso companheiro de Rio Grande.  Segundo ele, não era recomendável ficarmos por muito tempo ao ar livre com aquelas vestimentas.  E olhe que eram agasalhos excessivos para o frio do Rio. Aí deu-se início ao terceiro "mico".  Dessa vez, praticado por outro oficial.   Entramos... fizemos um reconhecimento do local (praxe entre militares).  O estabelecimento estava com meia lotação.  Dava pra escolher bem o lugar onde  queríamos ficar.  Alguém disse: "Que tal ficarmos nas proximidades da lareira?"  Todos foram concordes e nos sentamos próximos à lareira.  O oficial que deu a idéia (não digo o nome nem com ameaça de morte) escolheu sentar-se o mais próximo possível do equipamento.  Depois de algumas carnes, choriços e até uma "parrillada" Argentina, muito bem acompanhadas de boas sangrias e coquetéis, decidimos que era hora de voltar a Rio Grande.  Afinal, o dia seguinte era "de branco"!  Deixar aquele ambiente quente e tomar a lufada de vento frio na rua foi doloroso.  Parecia que estávamos saindo de uma sauna e entrando num freezer. Mais doloroso ainda para o companheiro que escolheu ficar quase dentro da lareira.  No dia seguinte o cara não conseguiu levantar e tivemos que substituí-lo nas suas tarefas. Esse ficou conhecido como "o mico da lareira".

Mercado Público Central de Porto Alegre
Missão cumprida, no quarto dia retornamos a Porto Alegre para, de lá, embarcarmos de volta ao Rio.  Chegamos à capital gaúcha muito cedo.  Faltavam ainda cerca de três horas para o nosso vôo.  Depois de uma perambulada pelo centro, para comprar vinhos e "goiabas" no Mercado Público Central de Porto Alegre (um prédio antigo extraordinário), tomamos dois táxis e fomos para o aeroporto.  Como ainda faltava mais de uma hora para o embarque e o "check in" ainda não havia sido aberto, subimos ao andar superior do aeroporto e começamos a degustar alguns chopes.  Foi aí que um dos que nos acomapanhavam cometeu o quarto "mico".  Olhou a caneca de chope, passou o dedo no lado externo,  e foi dizendo:  "Olha, esse chope parece que não está bem gelado, pois a caneca nem está suando?"  Olhamos pra ele, olhamo-nos todos... e quase que em uníssono dissemos: "Pô cara!  Deixa de ser quadrúpede!" "Não tá vendo que a temperatura externa é igual à do chope?"  "Como você quer que aconteça a condensação da água do ar nessas condições?".  Demos umas boas risadas e relembramos de todos os micos que pagamos desde a nossa chegada.  "Pegamos" nosso vôo e rumamos de volta para o aconchego dos nossos familiares, na Cidade Maravilhosa! 

Em mim, a felicidade era desmedida, pois, além do retorno ao convívio com os meus, aquele friozinho do inverno carioca parecia uma fornalha quando comparado com o Minuano que soprava em Rio Grande deixando a sensação de que minhas bochechas estavam sendo cortadas por uma afiadíssima navalha!

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